domingo, 28 de novembro de 2021

O paradoxo da era digital

É interessante como a nossa era vive um paradoxo constante. 

Relacionamentos

Através da internet, de mensageiros digitais e aplicativos, podemos conhecer pessoas sem sair de casa; podemos iniciar relacionamentos, dizer o que sentimos sem precisar olhar nos olhos ou produzir sons nervosos. Basta escrever e esperar. 

É fácil também falar com muitas pessoas ao mesmo tempo, de diferentes lugares e marcar encontros pessoais. 

Contudo, essa facilidade proporciona tantas opções que muitas pessoas passam por relacionamentos rasos, amizades superficiais. A exposição da vida e do cotidiano permite a livre interpretação dos diversos seguidores, que varia e interfere na relação entre as pessoas.

Não existe regra, mas, em geral, os relacionamentos que não se dispersam em meio às diversas distrações disponíveis, são os que costumam ter mais longevidade. Refiro-me aqui a qualquer tipo de relacionamento, seja amoroso ou de amizade.

Trabalho

Outro paradoxo é no âmbito profissional. 

Em nossa era digital, nunca foi tão fácil divulgar seu trabalho, enviar seu currículo, fazer cursos para se qualificar, fazer network, se profissionalizar, ter informação sobre as carreiras, salários, como se faz isso, como se faz aquilo. 

Por consequência, a pressão por conquistas aumenta. Pois se é mais fácil, você deveria conseguir, certo? 

A concorrência, a comparação entre as pessoas, os profissionais, tudo isso é uma roda inevitável que gira, por conta de todo o acesso rápido e abrangente de tudo. 

Quem está começando agora se depara com uma enxurrada de imagens de pessoas bem sucedidas, pessoas jovens e bilionárias. O jovem sente que tem tudo ao seu alcance e isso é um conforto que disfarça o medo de o tempo passar e ele ficar para trás. 

O medo sempre existiu, mas a projeção da vida alheia hoje é desproporcional a qualquer era anterior. Mesmo que se escolha rapidamente um caminho, é preciso muito foco, persistência e determinação no seu objetivo traçado para poder garantir uma carreira satisfatória.

Música

Um tópico à parte, inesperado. Por que a música está aqui? Por conta da mesma transformação surreal e superficial que está acontecendo.

A música, que em sua essência era pensada como um trabalho sazonal, de construção de um disco com faixas que contam uma história, hoje é pensada para conquistar um público que consome conteúdos de 15 segundos.

As músicas hoje são recursos que complementam fotos, momentos, por áudio no TikTok, no Instagram. Aperta o play na primeira opção e, se em 3 segundos não combinar com seu momento, passa-se para a próxima opção. Enfim a música foi escolhida, em um recorte do refrão, em geral, e uma breve linha de créditos de título e nome aparece no conteúdo, passando por vezes despercebida.

A cantora Adele, que gostaria de ter o resgate da experiência das pessoas ouvirem seu álbum da maneira em que foi construído, solicitou ao "Spotify" que retirasse o botão de reprodução em ordem aleatória na área destinada ao álbum. 

O Sporify concedeu à cantora este desejo, mas não sabemos o quanto isso vai realmente adiantar em um mundo que reproduz tudo em ordem aleatória.

Eu ainda prezo em ouvir um trabalho completo. De buscar mais sobre o artista, se eu gostar de uma música. De saber como é o álbum completo. Às vezes me decepciono, às vezes me surpreendo.

Conclusão

A facilidade traz benefícios, traz velocidade, mas traz consigo desafios gigantes. 

A próxima geração já nascerá em um mundo extremamente digital e que avança em passos largos para a valorização dos relacionamentos à distância e trabalhos remotos. É só o que existirá, então? É evidente que não, mas haverá uma onda de possibilidades nessa linha de pensamento.

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